Moçambique: Dominicanas apelam à solidariedade para socorrer as populações afetadas pelo ciclone Freddy

Março 26, 2023

Queridas irmãs, amigas e amigos!

Estou a escrever-vos desde Quelimane onde vim por uns curtos dias visitar as irmãs e suas famílias nesta situação de tristeza e desolação em que está todo este povo da Zambézia.

Não sei se conseguirei conciliar os pensamentos para poder partilhar sucintamente o sofrimento que experimenta todo este povo.

Penso que tereis acompanhado, a passagem do ciclone Freddy por Moçambique e Malawi, onde deixou um rasto de destruição. Acabou ao longo de 4 dias intensos, depois de três “novas entradas”a Moçambique, a última dos quais por Milange, onde as nossas irmãs estão isoladas por quebra das pontes e onde derrubou parte do Monte Tumbine que arrastou as famílias que viviam no sopé do monte e as levou no turbilhão das águas e das rochas que saíram da montanha…

Pela sua duração e fúria das águas e dos ventos que ultrapassaram os 200km/hora, trovoadas severas, ninguém se recorda de tanta devastação, apesar de bem habituados a tantas calamidades naturais… Não sabemos o que causou mais estragos e mortes! Uns faleceram, como dizia, arrastados pelas águas, outros electrocutados pelos postes de electricidade caídos, outros sob as paredes das casas ou muros que desabaram.

Não posso deixar de partilhar que também as duas comunidades das nossas irmãs, bem como o nosso Centro de Alfabetização do Bairro Chirangano onde vivemos, um dos mais atingidos pelo ciclone devido à extrema pobreza da sua população, foram igualmente bem fustigadas pelo ciclone…Também as nossas chapas voaram, toda a cobertura dos armazéns foi pelos ares, encharcando os sacos de arroz que as irmãs guardavam para quase um ano de sobrevivência, as fossas partidas, as paredes com rachas e o nosso Centro do Chirangano com o teto completamente destruído, computadores cheios de água e lama, livros, que riqueza de livros de estudo se perdeu…Mas já conseguimos tirá-los dos armários e deixamos a secar em duas salas de alfabetização que milagrosamente se salvaram. Foi nestas salas e na escolinha que ficaram abrigadas várias famílias do nosso bairro que viram as suas casinhas serem “engolidas” pela lama e troncos de árvores e lixo que vinha de todos os lados nas enxurradas…

As famílias das nossas irmãs não sofreram menos. Uma grande parte ficaram sem chapas, outras com paredes derrubadas, e uma delas foi toda a sua casinha que desabou…Encontramos no domingo, um dos filhos a tentar aproveitar um resto de parede, para com material partido espalhado pelo chão a conseguir improvisar um abrigo para viverem…

Mas as chuvas já passaram assim como os ventos, e fica a vida para reconstruir…É verdade que o povo é lutador e a resiliência se constata por todo o lado.

Este fim de semana, quando as irmãs passamos pelos bairros a visitar as famílias das nossas irmãs da Zambézia e outras famílias que ficaram mais afectadas, víamos no meio mais inabitável, a vida a querer ser mais forte do que a destruição que reinava. Os homens jovens no cimo de paredes bem molhadas ainda, pregando algumas das poucas chapas de zinco que conseguiram recuperar (parecia que alguém as tinha enrolado como rolos de papel), mulheres recolhendo pedaços de material local espalhado para tentar “remendar” a sua casinha. A título de exemplo, um prego é “um bem” que não se pode perder, no mercado duplicou o seu preço, para não falar das chapas que já se esgotaram no mercado, só se encontrando alguma a preços insustentáveis…Caminhos intransitáveis, cheios de fios eléctricos no chão, esgotos misturados com a água dos pequenos poços, onde as mulheres lavavam a roupa dos seus filhos e tiravam água para o uso da família…a água e…que água, meu Deus!

Mas porque a vida do pobre tem de ser amenizada, víamos também crianças, muitas crianças brincando felizes nesses charcos de água suja e lama, outras fazendo dos troncos dos coqueiros e mangueiras os seus baloiços…

Sabemos que os meios de comunicação social frequentemente nos bombardeiam com notícias alarmantes mas que depois de um ou dois dias deixam de ter actualidade…

Mas agora a vida tem de recomeçar e aqui mesmo no coração da cidade capital, Quelimane, não temos água potável, nem à venda no mercado, a energia depois de quase uma semana vem aos soluços, onde e quando poderá, a grande maioria deste povo, encontrar os meios mais indispensáveis para levantar as suas casinhas, pobres com certeza, mas onde possa abrigar-se com os seus filhos?!

Os poucos pertences que tinham, foram levados pela água e pela lama… as mães choram o arroz apodrecido nos sacos, que com tanto trabalho tinham armazenado para alguns meses…choram a roupinha das crianças levadas pelas águas e pela lama…

Não podemos dizer que o governo esteja insensível, e bem compreendemos que não é fácil responder aos gritos de tantos filhos a clamar por casa e pão, no meio de calamidades sem fim que abrangem a várias províncias, pois o Freddy fez estragos em muitas delas. Em Maputo, quanto vos poderia partilhar de bairros da cidade, como Mahotas, onde nós vivemos…

Aqui em Quelimane, o Município alugou dez grandes camiões que percorrem toda a cidade a tirar as árvores caídas, o lixo de todas as qualidades, mas…o lixo não acaba! E porque não acaba, a doença alastra…A malária, as doenças da pele, a filária e sobretudo a cólera está deveras a matar…A cólera não poupa a ninguém, mas as suas vítimas são sobretudo as crianças e as pessoas idosas. É a grande epidemia dos bairros. Não há ambulância nos hospitais dos bairros, a do Município que aliviava está estragada…as pessoas vão aos centros de saúde, já sem forças, é-lhes colocado um soro (que como dizem as nossas irmãs enfermeiras, não sabem até quando vai durar…) e aguardam a que uma carrinha de caixa aberta as venha buscar para as levar até ao hospital…Muitas, muitas…já chegam tarde…Os funerais são o pão-nosso de cada dia…Enquanto estou a escrever-vos esta manhã já passaram três funerais à nossa porta…

Queridos Irmãs e Amigos, a carta que pretendia que fosse curta, porque andamos todos saturados de palavras, já vai longa…Desculpem-me as repetições e a falta de síntese, mas não foi fácil fazer um resumo objectivo de tanto sofrimento.

Estamos a apelar à Vossa solidariedade. Diz-se e, nós o temos comprovado tantas vezes, “que o pouco com Deus é muito e faz milagres”. Muitos e muitas de vós já apoiam a nossa missão de tantas formas e há muitos anos…Desculpai se ainda vimos recorrer, uma vez mais, ao vosso bom e sensível coração…Naquilo que cada uma, cada um, puder cortar, (pode ser um café, uma cerveja ou outro…) a vossa ajuda será uma oportunidade de VIDA para estes irmãos mais empobrecidos.

Em nome deles e nosso, um OBRIGADA de coração!

Maria Inocência Costa
Missionária Dominicana do Rosário

APELO À SOLIDARIEDADE
INCRÍVEL ESTA REALIDADE
CAUSADA PELO CICLONE FREDDY ATIVO MAIS DE 35 DIAS!
MOÇAMBIQUE!

CONTA PARA DONATIVOS: PT 50003300004539268871205