Experiência de quem vê nascer e vê morrer

Abril 26, 2017

As imagens das casas que se seguem são a expressão dum culminar duma etapa dum PROJETO, nascido em 1976, por iniciativa das Irmãs Missionárias Dominicanas do Rosário, tempo em que reinavam, em pleno, o entusiasmo, a inovação e o compromisso cristão, social e político, fruto do Concílio Vaticano II e do 25 de abril, em Portugal.

A casinha aqui apresentada expressa a realidade atual do que ainda resta do Bairro 6 de Maio, pois que os Bairros das Portas de Benfica, das Fontainhas, do Bairro Novo e da Estrela d África, campo da ação do referido PROJETO, já não existem. A casinha fotografada em vários ângulos, é a residência das Irmãs que aqui desejam viver até quando lhe seja permitido, não só para acompanhar o pequeno Grupo de Famílias, umas 70, que ainda aqui se encontram e que são, sem dúvida, as que , no momento, mais precisam, devido a circunstâncias várias e, ainda, para que a Câmara Municipal, decida quanto antes o que vai fazer do Centro Social 6 de Maio.

Chegadas a viver este momento o que se sente? O que se pensa? O que deseja?

Tantas coisas que te vêm à cabeça e, sobretudo ao coração, que não é fácil pô-las por escrito! Mas como se deseja, apenas, partilhar o essencial é preciso estar atenta para que a emoção e a parcialidade não o ofusquem.

-Olhando para trás, o que apetece dizer é: OBRIGADO SENHOR!

Obrigado por este lindo Projeto, tão bem concebido pelas primeiras Irmãs, pela população cabo-verdiana, na sua maioria, a chegar, na altura, em catadupa e pelos Voluntários e amigos.

Obrigado pelos que depois foram chegando, sobretudo guineenses e são-tomenses que enriqueceram a comunidade

Obrigado pela fidelidade das Irmãs que se seguiram até aos dias de hoje, pelos Colaboradores do Centro Social 6 de Maio, pelos Voluntários e Amigos que sempre desejaram ser fiéis aos princípios básicos que alicerçaram o Projeto.

Obrigado pelos inumeráveis subprojectos, ações, atividades, ajudas que constituíram a vida, em todas as áreas ( pastoral, educativa, social, cultural, familiar, política, festiva, jurídica, psicológica, etc.) destes 41 anos de presença e de trabalho. Muitas delas bem sucedidas e outras não tanto, mas que, no seu conjunto, mereceram o elogio e a admiração de muita gente, de muitos grupos e Instituições

Obrigado por sabermos que, gente sem fim que por aqui nasceu e viveu e que agora se encontra espalhada pelas mais diversas partes do mundo, ou de Portugal, sempre que tem oportunidade nos diz coisas do género: “Obrigado: o que eu sou, devo-o às Irmãs, ao Centro Social, aos Amigos, à vida que aqui vivi”. Ou: ” Eu estou bem onde agora me encontro, mas se pudesse voltava para o bairro. Tenho tantas saudades!” Ou, ainda: Abrir a camisa para nos mostrarem a tatuagem no peito, ou nas costas que diz: “amo o bairro 6 de maio”. Outro exemplo: a organização dum primeiro Encontro, em Paris, no dia 6 de maio deste ano, para convívio das pessoas que foram destes Bairros e se encontram em França, Luxemburgo, Inglaterra e…

Como tem que ser grande o nosso OBRIGADO, meu Deus!

-Olhando o presente:

É tempo de saborear os frutos saborosos até agora amadurecidos e alguns dos quais foram mencionados.
É tempo de chorar o que não se conseguiu, pois muitas foram as pessoas dos Bairros que ficaram presas nos meandros das drogas, da delinquência, do fracasso, do analfabetismo, da ignorância, do fracasso profissional.
É tempo de sofrer e de ajudar, tudo o que se possa, as pessoas que ainda aqui se encontram com situações difíceis, ou porque, tendo direito a ser realojadas, estão indocumentadas, ou porque não têm direito por terem vindo para o bairro depois de 1993, altura em que se fez o realojamento.
É tempo de viver as preocupação, os medos, as inseguranças com as pessoas que estão a sair e que não gostam do sítio para onde vão, que se encontram com imensos problemas relativos às casas que compraram, etc., etc.
É tempo de desejar que esta realidade do bairro – que já não é Bairro, como dizem as próprias pessoas que ainda aqui se encontram – acabe quanto antes, devido à degradação do espaço, das casas, da lixeira que nos rodeia e, sobretudo, sobretudo, devido à degradação humana que está bem patente, diante dos nossos olhos, do nosso coração, devido às centenas e centenas – não sei se milhares – de toxicodependentes e traficantes de droga que dia e noite nos rodeiam e habitam os buracos, cubículos, que por todo o lado abundam, incluindo algumas partes da nossa própria casa.
É tempo de desejar, ansiosamente, que a Câmara nos diga com brevidade o que pensa sobre o futuro do Centro Social, sobretudo porque nos preocupam os cerca de 30 Colaboradores contratados que temos

-Olhando o futuro: Para o expressar não pode haver melhor escolha que a pintura da Ressurreição de Jesus, pintada pelo nosso Colaborador Nuno Remédio, que pela sua beleza e significado fala só por si. No entanto, direi que seria ótimo se tivéssemos uma Equipa de Irmãs Jovens, animadas, verdadeiramente missionárias, capazes de iniciar novos Projetos, dando continuidade a tudo o que já foi feito, mas com metodologias diferentes, uma vez que a população dispersa, está, ainda, mais aberta e sedenta!. Mas?!…Tudo CONFIAMOS nas Mãos de DEUS!

Comunidade das Irmãs da Venda Nova- Portugal