Creio que devo fazer um pedido de desculpa pelo atraso no envio de novidades. Por aqui, o ritmo é rápido e nem sempre se consegue ter tempo/disponibilidade para escrever.
A vida no Colégio corre dentro da normalidade, as meninas continuam lindas como sempre, estudam para que um dia transformem a realidade timorense. Essa é pelo menos, a esperança que tenho para o futuro de Timor. Que seja um país que traduza aquilo que o povo deseja para si mesmo. Aqui, é incutido às jovens o valor de viverem de acordo com as suas possibilidades, o de viverem com a noção de que comandam os seus sonhos e que a ambição de tornarem Timor diferente depende delas.
Por isso estudam, por isso aprendem aquilo que certamente não teriam possibilidade de estudar e aprender em suas casas.
Tenho dito que a realidade timorense não é aquilo que acontece aqui em casa. Lá fora, sente-se uma espécie de inércia no povo. Uma espécie de espera contínua e despreocupada por algo. Sente-se pouca vontade de lutar por algo, se calhar porque já esgotaram todas as forças na luta pela sua independência, ou se calhar porque aprenderam a viver da caridade, não sei.
O que sei é que à semelhança do que acontece em muitos outros países, sente-se também a injustiça, que aloca a riqueza a alguns, em detrimento de a dividir por aqueles que mais necessitam.
Essa é outra das coisas que as crianças e jovens aprendem aqui, que são uma família, e que a família não se mede pelo número de membros que a compõe, são um todo, por isso partilham o que têm entre si, mas também entre aqueles a quem é possível ajudar no exterior.
Este é, na minha opinião, o maior atributo de alguém que faça parte da Família Cristã, o saber partilhar e ter noção de que o que temos não nos pertence só a nós, mas a todos aqueles com quem fazemos Comunidade.
As actividades aqui no Colégio não param, o ritmo é acelerado e a imprevisibilidade uma constante. Nunca sabemos o que o dia seguinte nos reserva.
Sabemos sim, que poderemos aprender algo com aquilo que vamos vivenciando e experimentando ao longo dos dias.
Nem tudo corre como planeamos ou como idealizamos, por vezes, o que desejamos não se realiza, e nisto, refiro-me ao desejo que tinha em poder trabalhar com jovens que vivem do lado de lá dos muros do Colégio.
Aprendemos mais em Missão e com as experiências de missão, do que aquilo que julgamos vir ensinar ou transmitir.
Fiquei muito contente por saber da possibilidade de vir outro Voluntário. Desejo que o número de voluntários aumente aqui em casa. Isso traria muita alegria às meninas e certamente pintaria este espaço de mais cor e diversidade.
É com cor e diversidade que se criam vontades novas, sonhos imaginados e metas a atingir.
Aqui em Timor, existe como que um fosso, que separa o homem e o seu papel na Sociedade, com a mulher e a sua luta pela notoriedade social.
Existe como que um respeito inexplicável ao homem por parte da população feminina, um respeito doentio que se traduz em exemplos por vezes degradantes do ponto de vista humano.
Por esse motivo, sentia por vezes, quando cheguei aqui pela primeira vez e no primeiro ano, este espaço psicológico da parte delas que nos separava, agora sinto que se quebraram barreiras, que se ganhou uma confiança diferente que nos toca de forma mais profunda. E mesmo sem ter necessidade de fechar os olhos, sei e assumo que o futuro me fará ter recordações felizes e inigualáveis.
Há um outro aspecto da vida aqui no Colégio, que certamente será diferente para uma grande maioria de voluntários enviados em Missão. Aqui, os voluntários vivem literalmente em Comunidade, partilhando o mesmo espaço com as Irmãs.
Isso implica uma vida (quase) comum. Viver em comunidade é uma experiência mais profunda que viver em família. Quando partilhamos a nossa casa com a nossa família, não nos vemos com a frequência com que acontece numa vida em Comunidade, ou porque estudamos, ou porque trabalhamos…
Aqui não…somos convidados a permanecer em família 24h por dia. Como em família, há dias bons, e dias menos bons, mas há também a certeza de que o que nos une é um mesmo ideal e foi com base nesse ideal, que todos nós fomos conduzidos para este mesmo local.
Esta comunidade é um exemplo de paz e reconciliação, pois só desta forma o impossível se torna possível…e não imaginam a quantidade de milagres que temos sorte de presenciar neste espaço.
Agora despeço-me com um abraço de Timor,
Jorge Mestre